Democracia anti-antropocêntrica

Dispositivos de representação, escuta e visibilidade extra-humana

Autores

DOI:

https://doi.org/10.31068.310204

Palavras-chave:

Pós-humanismo; Democracia deliberativa; Emergência Climática; Virada ontológica; Estética da política.

Resumo

O artigo examina condições de possibilidade política, ética e estética de uma democracia representativa anti-antropocêntrica, ou seja, que tematiza e mobiliza dispositivos políticos para tratar vieses de tomadas de decisão política que impactam entidades extra-humanas. Para realizar tal objetivo, examinamos, primeiramente, fundamentos biológicos e ontológicos que sustentam a hipótese de que quaisquer entidades sensíveis são portadoras de um tipo de interesse inalienável: o de perseverar na própria existência. Considerada a validade e consequências dessa hipótese, transportamos a mesma para uma reflexão clássica da democracia representativa, que diz respeito das possibilidades e desafios de alargar esse regime político para que ele promova reconhecimento legal, político e moral de interesses tais inalienáveis. Nesse passo, ponderamos sobre desafios e possibilidades de tratamento do (insuperável) viés antropocêntrico em tomadas de decisão política acerca de extra-humanos a partir da possibilidade desses últimos tornarem-se minimamente representados, audíveis e visíveis. Em busca de esboçar respostas para essa problemática, apresentamos três condições necessárias para que tal reconfiguração anti-antropocêntrica possa ser operada em democracias representativas: a) inclusão de povos indígenas em tomadas de decisão acerca de entidades extra-humanas; b) experimentação de dispositivos deliberativos que suportem uma interação dissensual entre representantes de ontologias distintas; c) mobilização de dispositivos imagéticos e audiovisuais que minorem as “incomensurabilidades” de ser afetado pelos interesses inalienáveis de outos modos de existência.

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Biografia do Autor

Lucas Henrique Nigri Veloso, UFMG / DCP

Doutorando em Ciência Política (PPGCP-UFMG), Mestre em Comunicação Social (PPGCOM-UFMG) e Bacharel em Ciências Sociais (UFMG). Pesquisa inovação, participação e deliberação democrática com interesse especial em: a) Lutas por justiça e reconhecimento; b) Democracia digital; c) Ciência, tecnologia e controvérsias sociotécnicas. Membro do grupo de pesquisa em democracia e justiça - MARGEM. Especialização teórica em: Teoria democrática, social e antropológica; Vulnerabilidades; Movimentos sociais; Comunicação, Estética da política, Política da estética. Aplicações metodológicas: Teoria Política; Análise de Redes; Discurso Político; Etnografia e Cartografia; Ciência de Dados. 

Ângela Cristina Salgueiro Marques, UFMG/PPGCOM

Professora Associada do Departamento de Comunicação Social da Universidade Federal de Minas Gerais. Doutora em Comunicação Social pela UFMG (2007) e pós-doutora em Comunicação e Ciências Sociais na cidade de Grenoble (França), onde atuou junto a dois grupos de pesquisa: o Groupe de Recherche sur les Enjeux de la Communication (Institut de Communication et Medias - Université Stendhal) e o Groupe de Recherche en Sciences Sociales sur lAmérique Latine (MSH-Alpes, Université Pierre Mendes France). Seus atuais interesses de pesquisa estão voltados para a interseção entre a Comunicação, a Política e a Estética; entre a Comunicação e a Cultura, e entre a Comunicação e processos políticos, com destaque para práticas sociais e processos deliberativos; políticas públicas e cidadania;comunicação pública e comunicação organizacional; reconhecimento social de grupos minoritários; abordagem comunicacional-pragmática das relações entre estética e política; a composição de redes discursivas destinadas a publicizar questões de interesse coletivo (incluindo discursos televisivos ficcionais e de entretenimento); o aprimoramento de metodologias qualitativas de pesquisa que objetivam evidenciar a articulação entre diferentes atores, discursos estético-expressivos e arenas argumentativas.

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Publicado

14/02/2023

Como Citar

NIGRI VELOSO, L. H.; SALGUEIRO MARQUES, Ângela C. Democracia anti-antropocêntrica: Dispositivos de representação, escuta e visibilidade extra-humana. Teoria & Pesquisa Revista de Ciência Política, São Carlos, v. 31, n. 2, p. 65–85, 2023. DOI: 10.31068.310204. Disponível em: https://teoriaepesquisa.ufscar.br/index.php/tp/article/view/929. Acesso em: 30 dez. 2024.

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Artigos

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