A RELAÇÃO INTERESSE-ESTADO NA PETROLEIRA ARGENTINA YPF: TRAJETÓRIAS DOS CONSELHEIROS E DIRETORES EXECUTIVOS DA EMPRESA, 2002-2020


LA RELACIÓN ENTRE EL INTERÉS PRIVADO Y ESTADO EN LA PETROLERA ARGENTINA YPF: TRAYECTORIAS DE LOS DIRECTORES Y DIRECTORES EJECUTIVOS DE LA EMPRESA, 2002-2020


THE INTEREST-STATE RELATIONSHIP IN THE ARGENTINE OIL COMPANY YPF: TRAJECTORIES OF THE COMPANY'S BOARD MEMBERS AND EXECUTIVE DIRECTORS, 2002-2020




Nícolas Alfredo VIDAL1

e-mail: nicolas.vidal@unab.edu.ar


Júlio César DONADONE2

e-mail: donadojc@uol.com.br


Luis Miguel DONATELLO3

e-mail: ldonatello@ceil-conicet.gov.ar



Como referenciar este artigo:


VIDAL, N. A.; DONADONE, J. C.; DONATELLO, L. M. A

relação interesse-estado na petroleira argentina VPF: trajetórias dos conselheiros e diretores executivos da empresa, 2002-2020. Teoria & Pesquisa: Revista de Ciência Política, São Carlos, v. 33, n. 00, e024007, 2024. e-ISSN: 2236-0107. DOI:

https://doi.org/10.14244/tp.v33i00.1074


| Submetido em: 22/09/2023

| Revisões requeridas em: 21/11/2023

| Aprovado em: 09/05/2024

| Publicado em: 11/12/2024




Editora:

Profa. Dra. Simone Diniz

Editor Adjunto Executivo:

Prof. Dr. José Anderson Santos Cruz

1 Professor Associado de Sociologia na Universidad Nacional Guillermo Brown (Argentina), com doutorado em Ciência Política pela UFSCar e período sanduíche na Brown University. Pesquisador do NESEFi/UFSCar, atua em Sociologia Econômica, das Finanças e das Organizações. Seus temas incluem Estado, empresas, empresários e elites.

2 Professor Titular da UFSCar e coordenador do NESEFi, com experiência em Sociologia Econômica. Foi pesquisador visitante na UC Berkeley e na EHESS/Paris, além de bolsista produtividade do CNPq. Atua em temas como intermediários, financeirização e dinâmica dos campos.

3 Doutor em Sociologia pela EHESS/Paris e em Ciências Sociais pela UBA, com pós-doutorado na UC Santa Bárbara, EHESS e IESP-UERJ. Pesquisador Associado do CONICET, é Professor Associado na Universidad Nacional del Litoral e Diretor do Departamento de Sociologia. Atua em sociologia política das organizações patronais, sociologia histórica do nacionalismo e métodos de análise de redes sociais.

Teoria & Pesquisa: Revista de Ciência Política, São Carlos, v. 33, n. 00, e024007, 2024. e-ISSN: 2236-0107 DOI: https://doi.org/10.14244/tp.v33i00.1074 1

A relação interesse-estado na petroleira argentina VPF: trajetórias dos conselheiros e diretores executivos da empresa, 2002-2020


RESUMO: O presente trabalho analisa um aparente novo vínculo entre as elites econômicas e políticas com o Estado argentino, examinando a circulação e reconversão de diretores e diretores executivos dentro da empresa petrolífera argentina Yacimientos Petrolíferos Fiscales (YPF) entre 2002 e 2020. Diante disso, percebe-se que houve uma mudança na relação interesse-Estado. O objetivo deste artigo é analisar as trajetórias de vida dos diretores e diretores executivos da YPF durante o período de 2002-2020, visando identificar seus atributos e criar tipos ideais que facilitem a compreensão da relação interesse-estado nesse caso específico. O método empregado é a prosopografia, com dados sociodemográficos, de formação educacional e histórico de empregos dos diretores e diretores executivos da empresa. As conclusões parciais deste trabalho demonstram não apenas uma mudança nos perfis dos profissionais que lideram a empresa ao longo dos anos, de engenheiros para administradores e economistas com orientação internacional, mas também a emergência de um novo tipo ideal, o transgressor, que parece representar uma forma inovadora de profissionais do setor para cooptar recursos estatais.


PALAVRAS-CHAVE: Yacimientos Petrolíferos Fiscales (YPF). Elites Políticas e Econômicas Argentinas. Prosopografia. Conselheiros e Diretores Executivos da YPF.


RESUMEN: El presente trabajo analiza un aparente nuevo vínculo entre las élites económicas y políticas con el Estado argentino, examinando la circulación y reconversión de directores y directores ejecutivos dentro de la empresa petrolera argentina Yacimientos Petrolíferos Fiscales (YPF) entre 2002 y 2020. A partir de esto, se percibe un cambio en la relación interés-Estado. El objetivo de este artículo es analizar las trayectorias de vida de los directores y directores ejecutivos de YPF durante el período 2002-2020, con el fin de identificar sus atributos y crear tipos ideales que faciliten la comprensión de la relación interés-Estado en este caso específico. El método empleado es la prosopografía, utilizando datos sociodemográficos, de formación educativa e historial laboral de los directores y directores ejecutivos de la empresa. Las conclusiones parciales de este trabajo demuestran no solo un cambio en los perfiles de los profesionales que lideran la empresa a lo largo de los años, pasando de ingenieros a administradores y economistas con orientación internacional, sino también la emergencia de un nuevo tipo ideal, el transgresor, que parece representar una forma innovadora de profesionales del sector para cooptar recursos estatales.


PALABRAS CLAVE: Yacimientos Petrolíferos Fiscales (YPF). Élites Políticas y Económicas Argentinas. Prosopografía. Directores y Directores Ejecutivos de YPF.


ABSTRACT: This paper analyzes an apparent new link between economic and political elites with the Argentine state, examining the circulation and reconversion of directors and executive directors within the Argentine oil company Yacimientos Petrolíferos Fiscales (YPF) between 2002 and 2020. In light of this, it becomes clear that there has been a change in the interest-state relationship. This article aims to analyze the life trajectories of YPF's directors and executive directors during the period 2002-2020, to identify their attributes and create ideal types that facilitate the understanding of the interest-state relationship in this specific case. The method employed is prosopography, using socio-demographic data, educational background, and employment history of the company's directors and executive directors. The partial conclusions of this work demonstrate not only a change in the profiles of professionals leading the company over the years, from engineers to internationally oriented administrators and economists, but also the emergence of a new ideal type, the transgressor, which seems to represent an innovative way for professionals in the sector to co- opt state resources.


KEYWORDS: Yacimientos Petrolíferos Fiscales (YPF). Argentine Political and Economic Elites. Prosopography. YPF Board Members and Executive Director.

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Nícolas Alfredo VIDAL, Júlio César DONADONE e Luis Miguel DONATELLO


Introdução


O presente trabalho analisa um aparente novo vínculo entre as elites econômicas e políticas e o Estado argentino, uma mudança na relação interesse-Estado. Desse modo, examina a circulação e a reconversão de diretores e diretores executivos dentro da empresa petrolífera argentina Yacimientos Petrolíferos Fiscales (YPF) entre 2002 e 2020.

Tendo essa situação em vista, a discussão do objeto é norteada pela seguinte pergunta: o que ilustra o estudo das trajetórias do conselho de administração e da diretoria executiva da YPF para estabelecer o vínculo entre as elites econômicas e políticas e o Estado argentino do século XXI?

O objetivo deste artigo é analisar as trajetórias de vida dos diretores e diretores executivos da YPF durante o período de 2002-2020, visando identificar seus atributos e criar tipos ideais que facilitem a compreensão da relação interesse-Estado.

O método empregado para a coleta de dados é a prosopografia, que envolve investigar as características comuns de um grupo de atores históricos por meio de um estudo coletivo de suas vidas. Com base nesse método, reunimos informações sobre as carreiras de indivíduos que ocuparam cargos de direção na YPF entre 2002 e 2020. Para categorizar as informações coletadas e traçar suas trajetórias, nos concentramos principalmente em dados sociodemográficos (como nacionalidade, idade e gênero), formação educacional (incluindo graduação e pós-graduação, bem como as instituições frequentadas) e histórico de empregos (especificamente os setores de trabalho anteriores).


A Empresa


O Petróleo foi descoberto na Argentina em 1907, especificamente na Província de Santa Cruz, em Comodoro Rivadavia e, em 1922, foi criada a petroleira estatal. Assim, a YPF (Yacimientos Petrolíferos Fiscales) é a maior empresa Argentina, segundo sua receita.

No período, 1976-2019, a empresa teve mudanças significativas no controle corporativo. No ano 1977, o governo militar de Jorge Videla ditou a transformação de YPF. Com a promulgação do Decreto n.º 1080, a empresa estatal foi transformada em uma Sociedade do Estado (S.E.), ajustando seus estatutos ao marco da Lei n.º 20.705 de 1974, que regula o funcionamento das Sociedades do Estado. Essa legislação proibia a conversão de empresas estatais em sociedades anônimas e a incorporação de capitais privados ao seu patrimônio.


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Contudo, no caso da YPF, a lei conferiu maior autonomia à empresa, permitindo a desregulamentação de seu funcionamento e a terceirização de determinados processos.

O governo de Raúl Alfonsín, no ano de 1985, tenta reverter a deterioração das reservas de petróleo nacionais através do Plano Houston, no qual se ofereceram em licitação áreas de exploração mediante concurso público internacional. Entretanto, a intenção do governo de incorporar capitais privados na exploração não teve maior impacto, segundo Gadano (2006).

O governo de Carlos Saúl Menem, que assumiu antes do tempo devido a grave crise econômica e política que atravessava o país (julho de 1989), decidiu desregulamentar o mercado petrolífero, estabelecendo a eliminação de cotas de petróleo cru, bem como designou uma política de preços especiais antes de determinar por decreto a transformação de YPF em uma sociedade anônima. O Decreto n.º 2778/90, de dezembro de 1990, chama a atenção para a grave situação econômica e financeira que vivia a empresa e, por isso, proclamava a necessidade de transformá-la em uma empresa competitiva dentro de um mercado desregulado e desmonopolizado com uma gestão “eficiente”.

A Lei n.º 24.145 de 1992 contemplava a federalização dos hidrocarbonetos e a privatização de ativos e ações de YPF S.A, o que regulamentou a composição do capital acionário da nova empresa: 51% ficavam com o Estado nacional, até 39% nas mãos das províncias produtoras de petróleo, e até 10% para os trabalhadores. Todos os tipos de ações podiam ser transferidos para o capital privado mediante a sua venda. Contudo, apenas na questão do Estado, o congresso tinha que aprovar a porcentagem de ações caso o Estado quisesse vender suas ações e ficar com menos de 20% de participação na empresa.

Em 1999, Repsol, uma petroleira espanhola, comprou 99% das ações de YPF. O governo, então, desrespeitou a Lei de 1992 com um Decreto, o n.º 31/99 4, de janeiro de 1999, que permitiu a venda do total das ações em mãos do Estado argentino e terminou com a participação estatal da empresa, a maior do país. No ano 2007, o conglomerado argentino Grupo Petersen, da família Eskenazi, comprou cerca de 15% das ações da YPF, além de se comprometer a comprar mais 10% nos seguintes 4 anos. Em 2011, a família Eskenazi controlava os 25,46% das ações da YPF.

Em abril de 2012, mediante o Decreto n.º 530/2012, o governo de Cristina Fernández de Kirchner interveio na empresa, apelando à Lei de 1967 e, ademais, apresentou um projeto de Lei ao congresso para sua nacionalização.5 À vista disso, o Decreto foi elaborado com uma


4 http://mepriv.mecon.gov.ar/Normas/31-99.htm

5 http://mepriv.mecon.gov.ar/Normas2/530-12.htm

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análise detalhada da situação petroleira na Argentina e o desempenho de Repsol YPF desde o ano 1999, baseado no “Informe Mosconi”6. Ao mesmo tempo, o governo justificou a medida dizendo que um dos objetivos do país em matéria energética é o autoabastecimento de combustíveis. Referiram, aliás, que a atuação da empresa Repsol YPF foi contrária a esse objetivo (contrário aos objetivos do país), tendo diminuído os investimentos, baixado a produção e os níveis de reservas de hidrocarbonetos. Além disso, o Decreto apontou um esvaziamento da empresa em um processo de aumento da remissão de utilidades ao exterior — um aumento suspeito na distribuição de dividendos dirigidos à Espanha.

É importante enfatizar que, após a sanção da Lei n.º 26.741 em maio de 2012, a qual regulamenta o setor petrolífero e define a nacionalização dos 51% de YPF, o Estado garante pelo menos nove diretores para o Estado Nacional e as províncias produtoras de petróleo (Neuquén, Chubut, Santa Cruz, Mendoza e outras seis que compõem o OFEPHI, que é a Organización Federal de Estados Productores de Hidrocarburos) e um para os trabalhadores nucleados em SUPEH (Sindicato Unido de Petroleros e Hidrocarburíferos).


Aporte Teórico


Um foco de atenção para as Ciências Sociais é o estudo das elites, e mais especificamente na Ciência Política, com clássicos como Pareto (1903), Mosca (1939) e Michels (1969). As elites políticas, nesse sentido, podem ser definidas como “indivíduos e pequenos grupos relativamente coesivos, e estáveis com um desproporcionado poder para afetar os resultados políticos nacionais e supranacionais de forma regular” (Best; Higley, 2018, p. 3).

Apresentaram-se, conclusivamente, quatro correntes teóricas que, apesar das diferenças, permitem uma visão do que acontece com as elites e a relação entre elas e com o Estado. Destarte, tanto a teoria bourdesiana, o interlocking, o revolving door lobbyist e a teoria de intermediários são diferentes entradas para esse problema, as quais permitem visualizar, em diferentes espaços e momentos temporais, como foi tratada essa relação.

Pierre Bourdieu conseguiu, durante sua carreira, gerar um corpus teórico que foi utilizado por inúmeros trabalhos práticos próprios, nos quais, em muitos deles, foram focados



6 Realizado pelos Ministérios de Planificação Federal e de Economia da República Argentina no ano 2012 e apresentado no Congresso Nacional em junho desse ano. Ministerio de Planificación Federal, Inversión Pública y Servicios y Ministerio de Economía y Finanzas Públicas. (2012). Informe Mosconi. Disponible en http://www.mecon.gov.ar/wp-content/uploads/2012/06/Informe-MOSCONI-v12-modif.pdf.

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no Estado, os agentes que o ocupam e as escolas e os gostos que os definem (Bourdieu, 2013, 2014, 2016; 2003).

Os conceitos de campo e distintos capitais de Bourdieu ajudam para a análise da empresa argentina YPF. Para Bourdieu, campo é espaço que possui leis próprias, “no interior do qual há uma luta pela imposição da definição do jogo e dos triunfos necessários para dominar nesse jogo” (Bourdieu, 1990, p.119). O campo, então, é um espaço que se vive em constante tensão e luta, interna e externa, onde os agentes querem impor sua verdade (doxa) utilizando seus capitais específicos (econômico, cultural, social ou simbólico).

Além disso, Bourdieu (2013) argumenta que a nobreza de Estado é uma forma de capital simbólico, que confere prestígio, reconhecimento e autoridade para os que estão no topo da hierarquia social. Esta forma de poder é mantida e reproduzida por meio de mecanismos de legitimação, como a educação, as tradições culturais e as instituições estabelecidas. A questão de Bourdieu, quem ocupa esse Estado capitalista na França dos anos 1970 e 1980, pode ser utilizada para pensar no objeto do artigo científico e como as elites argentinas se reconfiguram para se manter no poder.

Monique de Saint Martin (Maldonado, 2010; Saint-martin, 1995, 2001, 2011)concentra sua pesquisa no estudo das elites sociais, definidas como pessoas que ocupam posições de poder, decisão e influência na sociedade e que possuem distintos capitais dos quais são conscientes e podem reorganizá-los dependendo das estratégias. Os conceitos de conversão, reconversão e desconversão explicam o passo dos agentes entre distintos campos, onde reconfiguram os capitais próprios para ganhar novos espaços, dado que o campo de origem perdeu predominância. Uma forma de reconversão é o pantouflage, que é a passagem de antigos funcionários do alto escalão, membros de grands corps estatais (minas, pontes, inspeção de finanças, Conselho de Estado etc.) para lugares de direção ou para a presidência de empresas privadas.

Com uma análise similar, Tissot (2005) observa as reconversões de militantes do maio francês e como ocorreram deslocamentos, transformações e conversões de homens e mulheres que atravessam muralhas (passe muraille) (Brunet, 2006) entre diferentes esferas sociais, ou mudam de posições dentro de uma mesma atividade. Offerlé (2009) analisa o termo “Patronat”, que define os patrões de empresa de uma forma dupla, como patrões, lideres ou donos de tal e, em outro sentido, agrupados numa “encarnação capitalista”, em que a participação política detida por eles é muito importante. Já para Dezalay e Garth (2002), as disputas entre as elites, em países como Argentina, levam a uma nova forma de poder estatal,

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onde os especialistas políticos formados nas Ciências Jurídicas são deslocados, nos últimos tempos, por tecnocratas formados nas Ciências Econômicas e suas escolas ortodoxas.

Um dos fenômenos estudados pela sociologia é a presença de uma mesma pessoa no diretório de duas ou mais empresas. Esse fenômeno é chamado interlocking directorates e foi amplamente estudado por diversos autores desde o século passado, sobretudo na sociologia estadunidense, que se viu influenciada pelos estudos sobre elites iniciadas por Brandeis (2009), Mills (1981) e Hunter (1953).

Ao se elaborar uma revisão da literatura sobre interlocking directorates, Mizruchi (1996) enumera quatro formas diferentes de como os autores a categorizaram. Uma é chamada de conspiratória, pois facilita a comunicação entre competidores. A segunda, é considerada um mecanismo de cooptação. A terceira, é interpretada como um mecanismo de monitoramento sobre as operações de uma empresa e a possibilidade de incidir sobre elas. A última pondera o interlocking como uma forma necessária para a ação política efetiva.

Na literatura analisada, encontraram-se mais referências sobre a segunda das opções, na qual o sujeito se torna protagonista e pertencente a uma elite. Por meio de laços, pode ter comportamentos políticos parecidos (Burris, 2005) e fazer parte de um círculo privilegiado (Useem, 1986) com alto nível de coesão social (Domhoff, 2017).

O termo porta giratória ou revolving door indica, na ciência política, a movimentação laboral de agentes do Estado (os quais podem ser legisladores ou terem importantes cargos no poder executivo, por exemplo, na regulação de alguns setores industriais) para empresas privadas do mesmo setor. Em outras palavras, o movimento de funcionários de alto nível do governo para o setor privado e vice-versa.

Podemos dividir esse grupo de teóricos em três subgrupos: o primeiro, analisado a partir de uma visão da teoria da eleição pública que privilegia as decisões racionais dos atores e que, de alguma forma, entende que o ator se posiciona onde se senta, “where you stand is where you sit” (Adolph, 2013). Isso quer dizer que defenderiam os interesses do lugar onde trabalham no presente momento e não pensando em um trabalho futuro (Miles, 1978; Niskanen, 1971).

Um segundo olhar pode ser representado nas ideias de suborno retardado (Schneider, 1993) e principal na sombra (Adolph, 2013). Segundo Schneider (1993), as posições dos funcionários sobre questões específicas depende de onde vem e para onde vão, e não de onde eles se sentam, como diz a Lei de Miles (1978).


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A relação interesse-estado na petroleira argentina VPF: trajetórias dos conselheiros e diretores executivos da empresa, 2002-2020


Um terceiro grupo de autores, como Lapira e Thomas (2014), Vidal et al. (2012), Luechinger e Moser (2014) e Draca (2014), aborda o fenômeno da “porta giratória” de maneira menos polarizada em comparação com os autores mencionados anteriormente.

Os conceitos de porta giratória, revolving door lobbyist e lobby aproximam-se do objeto de estudo deste trabalho, especialmente ao considerar os diretores que transitaram entre funções públicas e o setor privado, bem como as implicações desse movimento.

O surgimento dos gerentes, das empresas de consultoria, a “revolução dos gerentes" (Fligstein, 1993) e as transformações na gestão empresarial decorrentes dessas mudanças são temas explorados por Donadone e Baggenstoss (2014), Fligstein (1993), McKenna, Micklethwait e Wooldridge (1996), e O’Shea e Mandigan (1997).

Donadone (2012, 2003, 2001, 2015, 2017, 2004) realiza uma análise aprofundada sobre o universo dos intermediários e das empresas de consultoria, destacando as Big Five: Pricewaterhouse, Arthur Andersen, Ernst e Young, KPMG e Deloitte Consulting.

Coget (1999) propõe que a atuação dos consultores se concentra em três categorias principais: a arbitragem em disputas internas e externas das empresas; a capacidade de criar e disseminar conceitos no mundo corporativo; e a implementação de mudanças organizacionais. Vale ressaltar que as empresas de consultoria e os consultores têm conquistado um poder simbólico que os legítima nas esferas de atuação descritas pelo autor.


Os Diretores


Para uma apresentação mais ordenada dos dados, entendemos a necessidade de dividir o período observado em seis menores. Essa divisão foi baseada, entre outras variáveis, na história da empresa, no controle e no governo argentino do momento, tal como na constatação de momentos relacionados às mudanças no conselho de administração.

Assim, compreendemos que podemos determinar 6 subperíodos: Repsol 1 (2002-2004), Repsol 2 (2005-2007), Repsol-Eskenazi (2008-2011), Governo CFK (Cristina Fernandez de Kirchner, 2012-2015), Governo Macri (2016-2019) e Governo AF (Alberto Fernandez, 2020). Posteriormente, são apresentados os dados sociodemográficos e os dados da carreira acadêmica dos diretores e diretores executivos da YPF relacionados ao período de 2002-2020,

intervalo de tempo que é dividido nos subperíodos criados.

A Tabela 1 traz o resumo dos dados sociodemográficos dos conselheiros de YPF em cada período analisado.


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Tabela 1 - Dados sociodemográficos Diretores YPF por período



R1

R2

R-E

CFK

MM

AF

Média

Homem

100

94,74

100

93,34

92,85

80,95

93,65

Mulher

0

5,26

0

6,66

7,15

19,05

6,35

Idade (Anos)

54,46

52,66

55,4

48,52

55,63

54,95

53,60

Argentino

54

63,16

60,35

96,23

100

100

78,96

Espanhol

46

36,84

36,82

3,77

0

0

20,57

Outra

0

0

2,83

0

0

0

0,47

Fonte: Elaboração própria.


Observa-se que há uma maioria de homens para todos os períodos, só no último período há uma maior quantidade de mulheres e elas não representam os 20% dos diretores totais da empresa.

Tirando o período CFK, onde a idade média diminui para 48,52 anos, coincidindo com uma renovação dos cargos políticos do segundo governo de Cristina Kirchner, os diretores da YPF têm uma média de quase 55 anos.

Geralmente, os diretores da empresa são argentinos. Nos períodos da Repsol, sobretudo no primeiro, havia espanhóis representando à empresa dona de YPF. Depois da nacionalização da empresa em 2012, os números de estrangeiros tendem a zero.

A Tabela 2 traz o resumo dos dados sociodemográficos dos Diretores Executivos de YPF por período.


Tabela 2 - Dados sociodemográficos, Diretores Executivos YPF por período



R1

R2

R-E

CFK

MM

AF

Média

Homem

100

91,91

100

92,73

100

100

97,44

Mulher

0

9,09

0

7,27

0

0

2,73

Idade (Anos)

50,53

51,99

52,54

47,65

50

49,83

50,42

Argentino

60,37

50

63,74

100

100

100

79,02

Espanhol

39,63

50

29,55

0

0

0

19,86

Outra

0

0

6,72

0

0

0

1,12

Fonte: Elaboração própria.


Os diretores executivos da empresa, assim como os diretores, são na sua maioria homens, na média de 97,44% para o período. A idade média é menor para os diretores, mas os diretores executivos têm perto de 50 anos e são majoritariamente argentinos. No período Repsol, cerca de 4 a cada 10 diretores executivos eram espanhóis.


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A relação interesse-estado na petroleira argentina VPF: trajetórias dos conselheiros e diretores executivos da empresa, 2002-2020

Na Tabela 3, são apresentados os dados sobre a trajetória acadêmica dos diretores da

YPF.


Tabela 3 - Carreira acadêmica, diretores YPF por período




R1

R2

R-E

CFK

MM

AF

Média

Formação Acadêmica (%)

Engenharias

44,44

39,47

25,72

18

25,54

14,29

27,91

Ciências Econômicas

23,81

36,84

29,05

40,68

39,09

52,38

36,98

Direito

18,25

10,53

16,04

16,45

15,3

28,57

17,52

Sem Graduação

13,49

5,26

13,92

8,93

2,19

0

7,30


Universidade Graduação (%)

UBA

21,03

38,89

37,42

39,43

33,47

33,33

33,93

Outra Argentina

11,79

13,89

11,35

30,65

36,56

38,1

23,72

Particular Argentina

S/D

S/D

S/D

21,36

17,28

19,05

9,62

ITBA

S/D

S/D

S/D

S/D

S/D

S/D

0,00

Complutense de Madrid

25,13

5,56

21,03

S/D

S/D

S/D

8,62

Outra Espanhola

27,69

33,33

22,06

S/D

S/D

S/D

13,85


Tipo Pós-graduação (%)

Sem Pós

65,88

65,79

65,95

46,09

28,03

33,33

50,85

Programa

10,32

15,79

13,92

18,42

34,51

33,33

21,05

Mestrado

0

0

12,46

13,84

20,13

23,81

11,71

Doutorado

15,88

10,53

0

14,59

0

0

6,83

MBA

5,55

5,26

4,19

0

14,06

4,76

5,64

Universidade Pós- graduação (%)

UBA

0

22,62

2

19,56

22,93

14,29

13,57

Particular Argentina

0

0

10,22

50,43

35,72

35,71

22,01

Espanhola

63,33

30,95

36,67

S/D

S/D

S/D

21,83

Estadunidense

36,67

46,43

34,67

3,85

24,37

S/D

24,33

Área Pós-graduação (%)

Adm.e finanças

53,33

53,57

61,11

45,02

54,33

57,14

54,08

Engenharias

23,33

30,95

12,22

2,27

10,66

14,29

15,62

Economia

0

15,48

20,44

17,29

9,14

21,43

13,96

Direito

23,33

0

0

9,6

13,74

0

7,78

Fonte: Elaboração própria.


Na graduação, os cursos de engenharia perdem relevância entre os diretores e, ao mesmo tempo, são as carreiras econômicas que se destacam. Os graduados em direito se mantêm estáveis entre a população analisada.

A Universidade de Buenos Aires forma aproximadamente 1 a cada 3 conselheiros da empresa. É possível observar que as universidades particulares argentinas tomam destaque a partir do período CFK, após da nacionalização da empresa. Nos períodos em que a Repsol estava presente e muitos dos diretores eram espanhóis, há a presença de graduações cursadas na Espanha.

Teoria & Pesquisa: Revista de Ciência Política São Carlos, v. 33, n. 00, e024007, 2024. e-ISSN: 2236-0107 DOI: https://doi.org/10.14244/tp.v33i00.1074 10

Nícolas Alfredo VIDAL, Júlio César DONADONE e Luis Miguel DONATELLO


Outro dado destacável é o crescimento das titulações de pós-graduação. Em 1994, 83,33% dos diretores não tinha cursos de pós-graduação (Vidal; Donadone, 2023). Já no período do Governo Macri, 61,97 % dos diretores eram pós-graduados.

Nas universidades escolhidas para os cursos de pós-graduação, o predomínio da UBA cai nos últimos anos em detrimento das universidades particulares argentinas e das universidades estadunidenses.

São os cursos voltados às áreas de administração, finanças e economia que predominam entre as pós-graduações, sobretudo nos últimos dois períodos. Concomitantemente, os cursos de pós-graduação em engenharia perdem importância. Na Tabela 4 são apresentados os dados da carreira acadêmica dos diretores executivos da YPF.

Tabela 4 - Carreira acadêmica diretores Executivos YPF por período




R1

R2

R-E

CFK

MM

AF

Média

Formação Acadêmica (%)

Engenharias

32,22

50

26,85

25,15

42,47

58,33

39,17

Ciências Econômicas

32,22

22,73

26,57

37,42

27,88

16,67

27,25

Direito

24,81

18,18

8,34

10,05

17,32

16,67

15,90

Sem Graduação

0

0

10,7

10,05

0

0

3,46


Universidade Graduação (%)

UBA

24,81

33,64

33,94

34,65

37,42

25

31,58

Outra Argentina

24,81

4,55

16,34

25,15

27,88

41,67

23,40

Particular Argentina

S/D

S/D

S/D

30,15

12,32

8,33

8,47

ITBA

S/D

S/D

S/D

S/D

22,37

16,67

6,51

Complutense de Madrid

0

14,09

20,45

S/D

S/D

S/D

5,76

Outra Espanhola

21,48

33,64

13,72

0

S/D

S/D

11,47


Tipo Pós-graduação (%)

Sem Pós

50,37

36,36

43,65

47,47

32,42

41,67

41,99

Programa

21,48

27,27

21,15

20,1

17,32

8,33

19,28

Mestrado

14,07

13,64

15,32

15,1

17,32

25

16,74

Doutorado

0

18,18

6,12

7,27

0

0

5,26

MBA

0

0

0

0

32,93

25

9,66


UBA

0

15,48

0

0

0

0

2,58

Universidade Pós- graduação (%)

Particular Argentina

0

7,14

26,59

85,83

55,95

57,14

38,78

ITBA

0

0

0

0

0

14,29

2,38

Espanhola

30,55

39,29

34,17

0

0

0

17,34


Estadunidense

69,45

30,95

25,95

0

44,05

0

28,40


Adm. e finanças

61,11

69,05

78,77

57,5

74,41

71,42

68,71

Engenharias

8,33

30,95

2,22

14,17

14,88

14,29

14,14

Economia

22,22

0

0

9,17

0

0

5,23

Direito

8,33

0

5,71

0

0

0

2,34

Área Pós-graduação (%)

Fonte: Elaboração própria.

Teoria & Pesquisa: Revista de Ciência Política, São Carlos, v. 33, n. 00, e024007, 2024. e-ISSN: 2236-0107 DOI: https://doi.org/10.14244/tp.v33i00.1074 11



A relação interesse-estado na petroleira argentina VPF: trajetórias dos conselheiros e diretores executivos da empresa, 2002-2020


A formação acadêmica dos diretores executivos da YPF mostra uma linha diferente dos diretores. Os engenheiros perdem representação em dois períodos (R-E e CFK), mas recuperam e exibem seu maior valor (42,47% e 58,33%) nos últimos dois subperíodos (MM e AF).

A UBA continua sendo predominante como a universidade de graduação, só no último subperíodo (AF) os graduados de outras universidades nacionais são maioria.

O número de diretores executivos com pós-graduação é maior que os diretores com pós-graduação. Quase 6 de cada 10 diretores executivos têm cursos de pós-graduação e 5 de cada 10 dos diretores também são pós-graduados.

As universidades particulares argentinas são as mais procuradas para fazer os programas de pós-graduação (40% em todo o período analisado), mas começaram a ganhar importância desde o ano 2008 com a incorporação do grupo Eskenazi na propriedade da empresa.

Por último, os programas em administração e finanças somam quase 70% das escolhas de pós-graduação dos diretores executivos da YPF. A Tabela 5 apresenta os dados da carreira trabalhista dos diretores da YPF. Ela foi construída com base nos dados dos três trabalhos anteriores mais importantes desempenhados por cada diretor.


Tabela 5 - Carreira trabalhista diretores YPF por período




R1

R2

R-E

CFK

MM

AF

Média

Carreira Trabalhista Trabalho Anterior (%)

Setor de Energia e Petróleo

23,64

19,42

29,33

24,52

24,9

21,54

23,89

Outros Setores Industriais

10,91

7,77

16,2

1,92

5,22

6,15

8,03

Setor Financeiro

20

20,39

10,34

3,07

3,61

1,54

9,82

Jurídico

1,82

5,83

4,19

2,3

2,41

0

2,76

Organizações Internacionais

0

1,94

5,03

0,77

2,41

0

1,69

Consultoria

5,45

5,83

8,94

6,51

7,23

7,69

6,94

Mídia e telecomunicações

0

1,94

3,35

1,15

7,23

4,62

3,05

Cargos Públicos

10

9,71

8,38

40,61

32,93

43,08

24,12

Representação Sindical

10,91

9,71

5,03

3,07

5,22

4,62

6,42

Ensino e pesquisa

6,36

7,77

5,59

9,58

3,21

6,15

6,44

Outras categorias

10,91

9,71

3,63

6,51

5,62

4,62

6,83


Total

100

100

100

100

100

100

100

Fonte: Elaboração própria.


Pode-se observar na Tabela 5 que, para os trabalhos anteriores, há um predomínio dos setores de energia e petróleo, bem como de cargos públicos. O setor de energia e petróleo representa, em média, quase 24% dos cargos ocupados no período de 2002 a 2020. O pico de representação ocorre entre 2007 e 2011, com uma participação de 29,36%.


Teoria & Pesquisa: Revista de Ciência Política São Carlos, v. 33, n. 00, e024007, 2024. e-ISSN: 2236-0107 DOI: https://doi.org/10.14244/tp.v33i00.1074 12

Nícolas Alfredo VIDAL, Júlio César DONADONE e Luis Miguel DONATELLO


Quanto aos cargos públicos, nota-se uma predominância a partir de 2012, ano da renacionalização da empresa, durante o governo de Cristina Fernández de Kirchner (CFK). Desde então, quase 40% dos cargos ocupados pelos diretores da empresa eram no setor público. É importante lembrar que, a partir de 2012, a estrutura da empresa passou a ser a seguinte: 51% de propriedade estatal (51% do governo nacional e 49% das províncias produtoras de hidrocarbonetos) e 49% de propriedade privada, com diretores representando as províncias produtoras.


Tabela 6 - Carreira trabalhista diretores Executivos YPF por período




R1

R2

R-E

CFK

MM

AF

Média

Carreira Trabalhista Trabalho Anterior (%)

Setor de Energia e Petróleo

46,27

48,94

53,85

53,33

67,03

59,09

54,75

Outros Setores Industriais

4,48

4,26

19,23

0

4,4

0

5,39

Setor Financeiro

13,43

8,51

0

5,33

4,4

4,55

6,04

Jurídico

8,96

10,64

7,05

2,67

6,59

9,09

7,5

Organizações Internacionais

0

0

2,56

0

0

0

0,43

Consultoria

0

0

7,05

13,33

0

4,55

4,16

Mídia e telecomunicações

4,48

6,38

1,28

0

4,4

9,09

4,27

Cargos Públicos

4,48

4,26

3,85

8,00

0

9,09

4,94

Representação Sindical

0

0

0

0

4,4

0

0,73

Ensino e pesquisa

8,96

10,64

4,49

6,67

0

0

5,12

Outras categorias

8,96

6,38

0,64

10,67

8,79

4,55

6,66


Total

100

100

100

100

100

100

100

Fonte: Elaboração própria.


O setor de energia e petróleo predomina no período, representando aproximadamente 55% dos trabalhos anteriores dos diretores executivos da YPF. Em segundo lugar, os trabalhos desempenhados no setor jurídico correspondem a 7,55% do total.

É possível inferir que o cotidiano da empresa é conduzido por profissionais com experiência no setor de energia, além de advogados especializados em contratos e questões jurídicas relevantes para a companhia.

Com base nos dados encontrados sobre os diretores e diretores executivos da YPF, nos períodos analisados e nas diferentes correntes teóricas, elaboramos cinco tipos ideais de diretores da YPF: Clássicos/Ypefeanos, Interlockers, Revolving Door/Porta Giratória, Intermediários/Lobistas e Transgressores.


Teoria & Pesquisa: Revista de Ciência Política, São Carlos, v. 33, n. 00, e024007, 2024. e-ISSN: 2236-0107 DOI: https://doi.org/10.14244/tp.v33i00.1074 13

A relação interesse-estado na petroleira argentina VPF: trajetórias dos conselheiros e diretores executivos da empresa, 2002-2020


O estudo pode ser resumido na Tabela 7, que associa os diferentes tipos ideais analisados no capítulo anterior, juntamente com os períodos e as teorias correspondentes a cada um deles. O objetivo das considerações finais será, portanto, explicar essas relações.


Tabela 7 - Resumo dos Tipos Ideais de Diretores e Diretores Executivos da YPF


Tipos Ideais


Clássicos / Ypefeanos


Interlockers


RevovlvingDoor


Consultor / Lobista


Transgressores


Diretores

Nome

Ano

Nome

Ano

Nome

Ano

Nome

Ano

Nome

Ano

Héctor Fiorioli


Carlos De la Vega

2002-

2011

Gustavo Nagel

2012-

2015

Nicolás Arceo

2012-

2014

Miguel Galuccio

2012-

2015

Fernando Dasso

2007-

2016

José Blanco Balín

2002-

2004

Carlos Tombeur

2002-

2004,

2013

Patricia Charvay

2012-

2014

Carlos Alfonsi

2007-

2019

Mario Vázquez

2007-

2011

Miguel Madanes

2002-

2006

Cynthia De Paz

2014



Jorge Brito

2004-

2006

Carlos Olivieri

2002-

2006

Emmanuel Agis




Eduardo Elsztain

2005-

2007

Miguel Galuccio

2012-

2015

Daniel Montamat

2015-

2018



LuisPagani

2005-

2006



Emilio Apud

2015-

2018

Diretores Executivos

Fernando Dasso

2006-

2016



Carlos Olivieri

2002-

2005

Nicolás Arceo

2012-

2014

Miguel Galuccio

2012-

2015

Carlos Alfonsi

2002,

2007-

2020

Miguel Galuccio

2012-

2015

Doris Capurro

2012-

2014


Teorías


Nobreza de Estado/ Estudos Específicos


Interlocking


RevolvingDoor


Intermediários/ RevolvingDoor


Intermediários?


Período de etempo


R1, R2, R-ESK, CFK, MM, AF


R1, R2, R-ESK


R1, R2, CFK


CFK, MM


CFK


Educação


engenharia química/ recursos humanos

Ciências econômicas, relações institucionais

Direito, engenharia de petróleo, engenharia industrial,

contabilidade.

Ciências econômicas/ Pós- graduação

engenharia industrial/ Sociologia

Trabalhos anteriores


Toda a carreira na YPF


Outros sectores industriais e financeiros


Setor Público/ YPF


Setor Público/ Empresas de Consultoria

Setor de Energia/ pesquisa e consultoria de marketing

Fonte: Elaboração própria.


Teoria & Pesquisa: Revista de Ciência Política São Carlos, v. 33, n. 00, e024007, 2024. e-ISSN: 2236-0107 DOI: https://doi.org/10.14244/tp.v33i00.1074 14

Nícolas Alfredo VIDAL, Júlio César DONADONE e Luis Miguel DONATELLO


Além disso, na Tabela 8, podemos ver o resumo da trajetória de vida dos 20 diretores e diretores executivos de YPF que ajudaram como casos particulares na construção dos tipos ideais apresentados na Tabela 7.


Tabela 8 - Trajetória dos casos particulares de diretores e diretores executivos de YPF



Nome


Posição na empresa/Período trabalhado

Nacionalidade

Nascimento


Educação


Trabalhos Anteriores


Trabalhos posteriores

Héctor Fiorioli

1957-1985 (1983-

1985 Presidente)

Argentino

1928

·Química (UBA). ·

Doutor em Química (UBA)

  • YPF 1957-1985

  • Secretário Geral Arpel (Petroleiras Estatais Lat.)

  • Empresa de Consultoria própria.

Fernando Dasso

Diretor/ Diretor executivo

2006-2016

Argentino

1965

  • Relações Laborais UBA

  • Management Development IAE

  • YPF 93-17

  • Conselheiro Recursos Humanos ·Diretor Fundación Espartanos

Carlos Alfonsi

Diretor/ Diretor executivo/VP 2002,

2007-2020

Argentino

1960

Química UTMendoza Direção de Recursos Corp. U.Lausanne

  • YPF 1987-2019

  • Diretor de Energia Grupo Perez Companc


Carlos De la Vega

Diretor 1993-2011

Argentino

1936

Sem estudos

Diretor Luncheon Tickets 1991-1998

Diretor Ciba-Geigy Argentina · Presidente Cámara

Argentina de Com.

  • Novartis S.A.

  • Diretor titular La Caja ART S.A


José Blanco Balín

Diretor 2002-2004

Espanhol

1953

Ciências Econômicas e empresariais.

Universidad Complutense de Madrid.

  • Diretório de Repsol YPF, Barclays Bank, Ercros, NH Hoteles, Coto Minero Cantábrico o Rústicas MBS.

  • Banco Zaragonzano Diretor

90-96

  • Encarcerado por atos de corrupção em contratos públicos na Espanha.


Mario Vázquez

Diretor 2007-2011

Argentino

1935

Contador Público UBA

  • Professor UBA.

    Ceo Telefonica de Argentina

  • Diretor Telefônica Internacional, S.A. Sócio e diretor geral de

Arthur Andersen Sul 23 ano

  • Conselho diretivo de Globant S.A, Despegar.com, MercadoLivre


Jorge Brito

Diretor 2004-2006

Argentino

1952

  • Engenheiro UCA

·Banco Macro S.A PR. · Associação de Bancos Privados de Capital Argentino-ADEBA PR 02-

16

Juramento agropecuária PR

  • Banco Macro PR

Eduardo Elsztain

Diretor 2005-2007

Argentino

1960

  • Economia UBA

IRSA Real State PR. Cresud, Brasil Agro PR. Banco Hipotecário

IRSA Real State PR. Cresud, Brasil Agro PR. Banco Hipotecário vp


Gustavo Nagel

Diretor 2012-2015

Argentino

1967

  • Engenheiro Industrial UNComahue MBA IAE

SADE-Skanska várias posições 89-09.

Subsecretário de Planejamento e Serviços Públicos Neuquén DiretorRepr.

NeuquénHidroelétrica

Piedra del Águila.

Confipetrol Gerente General ·NGA consultoria Recursos Humanos Presidente/Dono JMAC Serviços Gerente General


Teoria & Pesquisa: Revista de Ciência Política, São Carlos, v. 33, n. 00, e024007, 2024. e-ISSN: 2236-0107 DOI: https://doi.org/10.14244/tp.v33i00.1074 15

A relação interesse-estado na petroleira argentina VPF: trajetórias dos conselheiros e diretores executivos da empresa, 2002-2020


Carlos Tombeur

Diretor 1999-2005

Argentino

1952

  • Direito UBA

Diretor do Banco Central de la República Argentina (1991-1992)

Subsecretario Legal del Ministerio de Economía y Obras y Servicios Públicos

(1992-1996)

Sócio Severgnini, Robiola, Grinberg & Tombeur

Miguel Madanes

Diretor 1993-1997

CEO 1997-1998.

Diretor 2002-2006

Argentino

1945

  • Engenharia Industrial UBA

  • CEO Fate 1968-92.

  • Presidente de ALUAR 88- 92

  • Presidente Nuem SA e Pentex SA ·Diretor ALUAR


Carlos Olivieri

Diretor 2002-

2006

Argentino

1950

  • Contador Público UNRosario

  • Especialização em management U Michigan e Stanford

  • Aerolineas Argentinas

  • Arthur Andersen 75-85. Professor UBA

  • Raymond James consultor financeiro.

  • Professor UDITella

  • Diretor Transportadora Gas del Sur

Miguel Galuccio

Presidente, Diretor Executivo (CEO) e Diretor 2012-

2015

Argentino

1968

  • Engenharia de petróleo ITBA

  • YPF até 1999.

  • Management Schlumberger 99-12

  • Diretor Schlumberger.

  • CEO Vista Oil and Gas


Nicolás Arceo

Diretor e Vice- Presidente de Administração e Finanças 2012-

2014

Argentino

1973

  • Economia UBA.

  • Doutorado Ciências Sociais FLACSO

  • Metrogas.

  • Compañia Mega

  • Consultor Economia & Energia ·Pesquisador CONICET


Patricia Charvay

Diretora 2012-

2014

Argentina

1982

  • Economia UBA

  • Consultora no Conselho de Coordenação de Políticas Soc. ·Diretora Nacional no Ministério Economia e Finanças

  • Diretora Edenor SA representando ao Estado

Nacional

  • Consultora Economia & Energia S.A

Cynthia De Paz

Diretora alterna 2012-2014

Argentina

1982

  • Economia UBA

  • Mestrado em Políticas Públicas FLACSO

  • Professora UBA

  • Subsecretária no Ministério de Economia

  • Banco BICE 15-16.

  • Consultora pxp

Emmanuel Agis

delegado direção executiva comercial 2012

Argentino

1981

  • Economia UBA

  • Mestrado em Economia UBA

  • Subsecretário de Programação Econômica 2011-13

  • Consultora pxp.

  • Assessor da ONU em macroeconomia.

  • Vice-Ministro da

Economia 2013-15


Daniel Montamat

Presidente 1987-

1989. Diretor

2015-2018

Argentino

1954

  • Economia e Direito UNCordoba ·

Doutorado Economia UCA Córdoba

  • Diretor Gas del Estado 1986. ·

    Secretario de Energia da Nação 1999-2000.

  • Diretor/Presidente da YPF

entre 1987 e 1989

  • Montamat e Associados.

  • Consultor Banco Mundial.

  • Professor UBA


Emilio Apud

Diretor 2015-

2018

Argentino

1945

  • Engenharia Industrial UBA. ·Especialização energia e energia econômica U Di Tella e Dupont (EUA)

Secretário Nacional de Energia 2001. Apud &Associados consultora. Fundação Pensar.

Professor U. Católica

  • Apud &Associados consultora.


Dóris Capurro

Vice-Presidente de Comunicação e Relações Institucionais 2012-

2014

Argentina

1952

  • Sociologia UBA

  • Presidenta Ibarómetro S.A Consultoria marketing e pesquisa de mercado

  • Capurro and Associates 79-

99 ·Professora FLACSO e U Salamanca

Espanha

  • Presidenta Luft SA Fundo investimento energia

Fonte: Elaboração própria.


O primeiro modelo ou tipo ideal de diretor da YPF é o dos Clássicos ou Ypefeanos, indivíduos que iniciaram suas carreiras na empresa quando ainda eram muito jovens, recém-

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graduados, e que nela permaneceram ao longo de toda a vida profissional. Esse tipo é, talvez, o mais difícil de se encaixar nas seis teorias analisadas. No entanto, podemos associá-los à teoria de Bourdieu (2013), considerando a YPF como um espaço de chegada, dado seu status de referência no setor petrolífero na Argentina, especialmente no século XX. Héctor Fiorioli (presidente da YPF na década de 1980), Fernando Dasso e Carlos Alfonsi são exemplos representativos desse modelo.

Carlos Alfonsi, por exemplo, nasceu em 1960 em Luján de Cuyo, Mendoza, Argentina. Graduou-se engenheiro químico pela UTN Mendoza e possui estudos de pós-graduação no MIT, nos Estados Unidos. Durante toda a sua carreira profissional, trabalhou na YPF, desde seus primeiros anos em Luján de Cuyo até se tornar diretor e, posteriormente, diretor executivo da empresa, com 12 e 15 anos de atuação, respectivamente, no período estudado neste trabalho. Ao todo, Alfonsi acumulou 35 anos de carreira na empresa até agosto de 2021, quando deixou a companhia por decisão do novo CEO.

O caso particular de Fiorioli envolve uma relação com a política, que facilitou sua ascensão à presidência da empresa. Alfonsi, inclusive, esteve entre os candidatos à presidência da empresa em 2021, mas acabou perdendo a concorrência e sendo demitido pelo novo CEO, Affronti. No caso de Dasso e Alfonsi, ambos atravessaram a mudança no controle da empresa, permanecendo no diretório durante o período da gestão da Repsol e, posteriormente, após a renacionalização em 2012.

O segundo modelo apresentado é o de diretor interlocker, que se alinha à teoria dos interlocking directorates. Esses diretores ocupam simultaneamente assentos em dois ou mais conselhos de empresas diferentes ao longo de suas carreiras. Os diretores interlockers geralmente têm formação em áreas relacionadas às ciências econômicas. Para eles, o capital mais valioso é composto pelas redes de contatos que constroem ao longo da carreira, passando por diferentes tipos de empresas, tanto do setor industrial quanto não industrial. A capacidade de compreender a legislação vigente e os contatos para o financiamento das empresas são virtudes altamente valorizadas pelos conselhos que os contratam.

Os casos de Carlos De la Vega, José Ramón Blanco Balin e Mario Vázquez exemplificam o modelo de diretor interlocker. São profissionais que dedicaram boa parte de suas carreiras a atuar em diferentes conselhos de empresas argentinas e estrangeiras. O caso de Vázquez é particularmente claro, pois, aos 87 anos, continua a fazer parte de conselhos de empresas argentinas importantes, como Mercado Livre, Globant e Decolar. Sua vasta rede de contatos com outras empresas e entidades financeiras, além do conhecimento profundo das leis

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argentinas, continuam sendo um capital valioso para sua atuação em novas empresas. Balin, De la Vega e Vázquez fazem parte de uma elite empresarial.

Brito, Elsztain e Pagani, proprietários do Banco Macro, IRSA e ARCOR, respectivamente, são exemplos de diretores interlocker. Em síntese, o tipo ideal de diretor interlocker consiste em pessoas que fazem parte de dois ou mais conselhos ao mesmo tempo, sendo mais proeminente no período em que a Repsol controlava a YPF.

O terceiro modelo de diretor que consideramos importante destacar é o do “revolving door” ou porta giratória, conforme o modelo teórico apresentado anteriormente. Esse tipo de diretor transita entre o setor público e o privado, já que as empresas privadas valorizam a experiência de ex-funcionários públicos, uma vez que estes conhecem as leis e podem antecipar movimentos governamentais. Ao mesmo tempo, uma circulação no sentido oposto, do setor privado para o público, sem o período de “cool off”, pode beneficiar as empresas do novo funcionário público, principalmente se ele precisar legislar ou se manifestar sobre setores industriais nos quais a empresa atua.

O perfil acadêmico desses diretores não é homogêneo, pois podem ser advogados com conhecimentos sobre o aparato estatal, economistas ou engenheiros especializados em setores industriais específicos.

Embora os tipos ideais sejam flexíveis e, em nosso trabalho, haja diretores que podem se encaixar em diferentes modelos em momentos distintos, podemos afirmar que Nagel, Tombeur, Madanes e, por vezes, Galuccio, podem ser considerados diretores do modelo “revolving door”.

Resumidamente, o tipo ideal de “revolving door” se alinha com a teoria que leva o mesmo nome e se manifesta nos períodos da Repsol 1 e 2, bem como no período CFK. O perfil dos conselheiros nesse modelo é heterogêneo, incluindo graduados em direito, engenharia e contabilidade.

Por exemplo, Carlos Maria Tombeur, argentino formado em Direito pela Universidade de Buenos Aires, foi diretor do Banco Central da República Argentina e subsecretário legal do Ministério da Economia durante o governo de Menem. Ele integrou o diretório da YPF entre 1999 e 2005. Atualmente, Tombeur faz parte do escritório de advocacia Severgnini, Robiola, Grinberg & Tombeur, onde atua nas operações de financiamento no mercado de crédito, mercado de capitais, fideicomissos públicos e concessões de entes públicos. O escritório teve como clientes a YPF e a Repsol em diversas ocasiões, conforme pode ser verificado no site e no currículo de Tombeur.

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Os dois próximos modelos têm uma estrutura similar com o de circulação e “revolving door” e são parecidos entre si, mas com saídas diferentes. Se no modelo anterior o percurso era Empresa-Estado-Empresa ou Estado-Empresa, nos outros dois modelos identificamos o caminho Empresa-Estado-Consultoria/Lobby ou Empresa-Estado-Empresa Própria. O quarto modelo de diretor é o de Consultor/Lobista. Os diretores desse modelo passaram pela empresa e depois, em vez de voltar ao setor privado em empresas do mesmo setor, começam uma empresa e carreira como consultores ou lobistas.

A conexão teórica deste tipo está dada com a teoria da intermediação e, em menor medida (talvez de forma complementária), com o “revolving door lobbyist”. Os consultores/lobistas são predominantemente vindos das ciências econômicas, com carreiras no setor estatal que dão um capital simbólico que funcional como meio de troca no momento de oferecer os serviços. Entendemos que alguns deles, desde a própria consultora, a qual oferece serviços de informação, consultoria e de gestão, ficam perto de vender o acesso ao Estado mediante as conexões que possam ter nos poderes do Estado.

Este tipo ideal pode ser observado nos subperíodos do Governo CFK e do Governo Macri, especialmente ao se analisar os casos específicos da YPF. É possível identificar dois grupos distintos: os novos consultores, atualmente ligados ao governador da província de Buenos Aires, Axel Kicillof (Nicolás Arceo, Patricia Charvay, Cynthia de Paz e Emmanuel Alvarez Agis); e os antigos consultores, como Daniel Montamat e Emilio Apud, que foram secretários de Energia e estão mais associados ao radicalismo do governo De la Rua e a Juntos por el Cambio (Macri) na atualidade.

Em resumo, o tipo de consultor/lobista refere-se a indivíduos com graduação e pós- graduação em economia ou administração, que ocuparam posições importantes no Estado argentino e utilizaram essa experiência para fundar suas próprias consultorias no setor de energia e economia, mantendo, provavelmente, acesso ou contatos com o governo.

Um exemplo do primeiro grupo é Nicolás Arceo (1973). Cursou o ensino médio no Instituto Libre de Segunda Enseñanza (ILSE), graduou-se em Economia pela UBA e obteve seu doutorado em Ciências Sociais pela Facultad Latinoamericana de Ciencias Sociales (Flacso). Arceo trabalhou junto ao ex-ministro da Economia e atual governador da província de Buenos Aires, Axel Kicillof. Foi colega de Kicillof na universidade, onde ambos faziam parte do partido TNT (Tontos pero No Tanto). Arceo ocupou o cargo de subsecretário de Planejamento Econômico no Ministério da Economia durante a gestão de Kicillof e, representando o Estado Nacional, esteve nos conselhos de administração da Metrogas e da Compañía Mega. Além

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disso, foi diretor de Finanças da YPF, uma posição de grande relevância na empresa. Arceo é, ainda, pesquisador (afastado) do Conicet e professor na Flacso, onde ministra seminários sobre economia e energia. Atualmente, ele, juntamente com a ex-diretora da YPF, Patricia Maria Charvay, lidera a Consultora Economia & Energia.

O último modelo identificado é novo e não está caracterizado na bibliografia analisada, parecendo representar um tipo de capitalismo do século XXI, vinculado a fundos de investimento e novas formas de controle sobre as empresas e sua relação com o Estado. O modelo que denominamos “transgressor” envolve diretores da YPF que, ao deixarem a empresa, criam novas empresas de energia, associadas a fundos de investimento dos Estados Unidos.

Os dois casos identificados, Miguel Galuccio e Doris Capurro, extrapolam o modelo de consultor/lobista. Além de terem ocupado posições no Estado, especificamente na YPF, eles não se limitam à prestação de serviços ou conexões, como o modelo anterior, mas criam empresas de energia que, de alguma forma, competem diretamente com a própria YPF.

Miguel Galuccio (Paraná, 1968) é filho de uma professora de inglês e de um empresário (Miguel Galuccio Pai), além de ser irmão de dois engenheiros e um contador. Cursou o ensino médio na Escola Industrial do Paraná e graduou-se como engenheiro de petróleo em 1994 pelo Instituto Tecnológico de Buenos Aires (ITBA). Nesse mesmo ano, iniciou sua carreira na YPF, onde chegou a ser responsável pela produção da empresa em General Las Heras, na província de Santa Cruz, no sul da Argentina. Posteriormente, trabalhou na Maxus, subsidiária da YPF nos Estados Unidos, e, em seguida, na Indonésia, antes de deixar a YPF em 1999, após a aquisição da empresa pela Repsol, devido a divergências de gestão. Entre 1999 e seu retorno à YPF em 2012, Galuccio trabalhou na Schlumberger, uma empresa líder em serviços de petróleo, onde se tornou gerente geral das operações da companhia no México e na América Central, sendo o primeiro latino-americano a ocupar esse cargo.

Em abril de 2012, foi nomeado pela presidente Cristina Fernández de Kirchner como CEO e presidente da YPF, posição que ocupou até os primeiros meses de 2016, quando foi removido pelo novo presidente, Mauricio Macri. É importante destacar que sua nomeação à presidência da YPF ocorreu devido às conexões políticas de sua família. Seu irmão mais velho, Carlos, ex-presidente da UIA de Entre Ríos, foi quem apresentou seu nome ao ex-governador da província, Sergio Urribarri, que, por sua vez, o recomendou à presidente Fernández de Kirchner. Atualmente, Galuccio é CEO da Vista Oil & Gas e membro do conselho diretor da Schlumberger, sendo o primeiro latino-americano a integrar esse conselho.

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A empresa Vista Oil & Gas foi fundada em 2017 no México e fez sua estreia no mercado por meio da Bolsa Mexicana de Valores (BMV), utilizando um método inovador denominado SPACs (Special Purpose Acquisition Company). Esse método permite que as empresas se introduzam no mercado de valores para captar recursos com o objetivo de investir em novas aquisições. Com esse modelo, a Vista Oil & Gas teve um prazo de 24 meses para adquirir ativos no México, na Colômbia, no Brasil ou na Argentina.

Sob a liderança de Galuccio, a empresa arrecadou mais de 650 milhões de dólares, superando em 30% o valor inicialmente previsto. Com esse capital, a Vista adquiriu as participações da Pampa e Plustetrol na Argentina. Atualmente, é a quarta maior produtora de petróleo do país e a segunda em produção de petróleo não convencional (Shale Oil), ficando apenas atrás da YPF.

Um dos principais investidores que possibilitaram a criação da Vista Oil & Gas foi o fundo de investimento Riverstone Investment Group LLC, fundado por Pierre F. Lapeyre e David M. Leuschen, que atualmente detém 14,4% das ações da empresa.

Doris Capurro foi presidente da Fundação YPF e diretora executiva da empresa entre 2012 e 2014. Nascida em 1952, é atualmente presidente da Luft, uma nova empresa de energia renovável.

Dos casos analisados, o de Capurro se destaca por seu perfil mais heterodoxo, devido à sua trajetória, que inclui a graduação em Sociologia e a criação das consultoras Ibarometro S.A. e Capurro & Associados, ambas focadas em marketing e pesquisa de mercado. Posteriormente, fundou a Luft AS, um fundo de investimento em energia, do qual é presidente.

A Luft foi criada em 2016, em parceria com o fundo americano Castlelake e com a Pampa Energia (liderada por Nicolás Caputo). Juntos, construíram o primeiro projeto eólico (100 MW) da empresa na província de Buenos Aires, adjudicado no âmbito do RenovAr, um projeto estatal voltado à geração de energia eólica.

Em entrevista ao Econo Journal, Capurro relatou que conheceu Miguel Galuccio por meio do irmão dele, Carlos, ex-presidente da UIA Entre Rios. Na época, Galuccio demonstrava interesse em aprender mais sobre a política argentina (cerca de 2010), enquanto ela buscava entender mais sobre o setor de energia. Essa relação, mediada por Carlos Galuccio (o mesmo irmão que o apresentou ao Governador Urribarri e à Presidenta Kirchner), culminou com Doris Capurro assumindo uma posição relevante na YPF.

Na mesma entrevista, Capurro também falou sobre sua relação com o ex-presidente Mauricio Macri, com quem fundou a instituição “Creer y Crecer”. Dessa fundação, Marcos

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Peña, ex-chefe de gabinete de Macri, foi um dos principais integrantes e havia sido assistente de Capurro na fundação.

O tipo transgressor parece difícil de ser integrado a uma única teoria apresentada neste estudo, mas, ao mesmo tempo, utiliza elementos de todas elas. Os casos de Galuccio e Capurro demonstram o uso do capital social e simbólico na concretização de seus objetivos, seja ao ingressar em empresas ou ao obter o capital necessário para fundá-las. Além disso, ambos fazem parte de uma elite empresarial com conexões importantes no governo e possuem características de porta giratória, além de atuarem como consultores/lobistas.

Ao analisar a sociologia da intermediação proposta por Donadone (Donadone; Baggenstoss, 2017; Donadone; Sznelwar, 2004), observa-se nos casos de Galuccio e Capurro uma abordagem diferente dos empresários tradicionais. Eles não se limitam à intermediação nem à venda de serviços para empresas estatais, mas avançam para a criação de empresas em parceria com fundos de investimento internacionais, com o objetivo de investir no setor energético. Caso mais exemplos semelhantes sejam encontrados em outros setores empresariais, essa prática poderia ser considerada uma variante da teoria da intermediação.

Em resumo, o tipo transgressor de consultor da YPF é uma pessoa com grande capital social e simbólico, que aproveita as oportunidades para o seu desenvolvimento pessoal, por meio da criação de empresas de energia. Esse tipo ideal parece transcender a bibliografia analisada e representa uma nova forma de interação entre empresários e o Estado.


Considerações finais


As conclusões parciais deste trabalho demonstram não apenas uma mudança nos perfis dos profissionais que lideraram a empresa ao longo dos anos, passando de engenheiros para administradores e economistas com orientação internacional, mas também a emergência de um novo tipo ideal, o transgressor, que parece representar uma forma inovadora de profissionais do setor cooptarem recursos estatais.

Com base na pergunta formulada na introdução, acredita-se que o vínculo entre as elites econômicas e políticas e o Estado argentino no século XXI não ocorre de forma unidirecional, mas por meio de diversas figuras, que estão representadas nos cinco tipos ideais apresentados ao longo deste artigo. A YPF teve e continua a ter diferentes perfis de diretores e executivos, os quais foram agrupados nos cinco tipos ideais descritos: Clássicos, Interlockers, Porta Giratória, Intermediários e Transgressores.


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As crises econômicas cíclicas na Argentina, associadas à fragilidade institucional, provocam mudanças na empresa e geram um grau de imprevisibilidade, o que se torna evidente quando observamos as alterações no controle corporativo, nas políticas internas e na direção estratégica que a empresa busca seguir.

Os vínculos entre o Estado (e a empresa) e os empresários muitas vezes são opacos, caracterizados por conluios, seja pela entrada e saída de executivos da empresa, que se tornam intermediários e vendem serviços para a YPF, ou, no caso dos transgressores, pela criação de novas empresas, aproveitando os conhecimentos adquiridos na própria YPF.

Podemos refletir sobre os vínculos entre as elites empresariais e estatais, que parecem operar com uma visão de curto prazo, tratando o Estado como um problema, mas também como uma solução (Donatello, 2013), ou atuando em esferas privilegiadas de acumulação(Castellani, 2009).

Para concluir, podemos nos questionar se essas movimentações são etapas obrigatórias, dadas as dimensões do mercado petrolífero argentino; ou se são poucos os representantes dessa elite do poder; ou se podem ser consideradas como corrupção ou conluio tácito, ou, ao menos, situações opacas. Nesse sentido, entende-se que uma continuidade da análise deste artigo seria pertinente.

Em primeiro lugar, seria relevante expandir o estudo realizado com a YPF para outras empresas do setor, incluindo algumas estatais ou mistas, como a Petrobras, Pemex e Statoil, ou privadas, como a Aramco.

Em segundo lugar, dentro da Sociologia Econômica, seria importante aprofundar a pesquisa sobre a BlackRock e os fundos de investimento em energia, especialmente sobre a forma como sua participação, fragmentada em diversas companhias do setor, poderia auxiliar no controle e na busca por informações privilegiadas sobre o setor como um todo. Nesse contexto, destaca-se a participação da BlackRock em empresas como a Petrobras e a Statoil norueguesa, bem como a atuação da Riverstone e da Castlelake no setor energético, por exemplo.


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Teoria & Pesquisa: Revista de Ciência Política São Carlos, v. 33, n. 00, e024007, 2024. e-ISSN: 2236-0107 DOI: https://doi.org/10.14244/tp.v33i00.1074 28