Um historiador do Brasil e das Relações Internacionais: Entrevista com o Prof. Dr. Clodoaldo Bueno
Teoria & Pesquisa: Revista de Ciência Política, São Carlos, v. 32, n. esp. 3, e023026, 2023. e-ISSN: 2236-0107
DOI: https://doi.org/10.14244/tp.v32iesp.3.1039 4
Questão 4: O Senhor vivenciou por dentro, como aluno, pesquisador e professor, a
Universidade e a pós-graduação brasileira dos anos 1960 até os dias atuais. Quais seriam as
principais mudanças e continuidades na sua visão?
CB: Não sou versado em legislação de ensino, mas observei que a lei federal 5.540 de 1968 foi
marco decisivo na estrutura e organização das universidades. Até os anos de 1960 fazia-se o
doutoramento sem a obrigação de frequentar cursos. A relação do pesquisador se dava
exclusivamente com seu orientador. A partir dessa legislação estabeleceu-se uma data para os
já inscritos concluírem e defenderem o doutoramento direto. A partir daí os graus de mestre e
doutor só poderiam ser expedidos pelos cursos de pós-graduação, com prazos e normas
claramente definidos. Tornaram-se obrigatórios o exame de proficiência em língua estrangeira,
frequência às disciplinas e exames de qualificação.... A meu ver foi uma atualização necessária,
tanto é assim que ainda vige. O doutoramento, até então, era algo demorado, não raro, uma obra
da maturidade profissional pessoal. A tese doutoral possuía mais peso na academia do que
agora, pois poucos eram os doutores, salvo nas universidades bem estruturadas, normalmente
rigorosas na concessão do título. O sistema atual também não está isento de problemas, a meu
ver. Não percebo a necessidade de se cursar disciplinas que não sejam relacionadas ao tema da
tese. Percebo, também, que existe um afã pelos números a fim de atender a metas e prazos, o
que, não raro, resulta em dissertações e teses de qualidade duvidosa. Os textos devem
proporcionar algo novo, mesmo que seja algo modesto, desde que seja alicerçado em fontes
confiáveis. A principal missão da universidade é criar e divulgar o saber. Para que isso aconteça,
cumpre-lhe descobrir e apoiar talentos. De acordo com minhas observações pessoais, o
pesquisador conta hoje com circunstâncias e condições bem mais favoráveis do que as das
décadas de 1950 e 60: a contratação inicial pelas FFCL públicas isoladas do Estado dava-se em
tempo parcial; hoje o contratado já começa no RDIDP (regime de dedicação integral à docência
e à pesquisa). A obtenção desse regime ocorria ao final de um processo demorado,
fundamentado, sobretudo, em um projeto de pesquisa, (que corria separado do contrato de
trabalho), e julgado pela Comissão Permanente de Regime de Trabalho (CPRT) do Conselho
Estadual de Educação. O tempo integral era concedido por três anos, durante os quais o docente
pesquisador apresentava dois relatórios anuais sobre o andamento da pesquisa. Somente após o
relatório final, a CPRT decidia sobre a manutenção do docente nesse regime, mesmo a decisão
favorável não o desobrigando dos relatórios anuais. Nos dias atuais o docente-pesquisador nas
universidades públicas têm, desde a graduação, condições bem mais amenas do que as do nosso