Considerações sobre a política e a economia na Argentina do tempo presente (1983-2020)
Teoria & Pesquisa: Revista de Ciência Política, São Carlos, v. 32, n. esp. 3, e023028, 2023. e-ISSN: 2236-0107
DOI: https://doi.org/10.14244/tp.v32iesp.3.1038 8
Assim, Alfonsín viu se liquefazer sua sustentação política no último ano de mandato,
em 1989. Dois anos antes, a UCR já havia perdido a maioria no legislativo e sido derrotada em
todas as eleições para os governadores de província, com exceção de Córdoba e Rio Negro
(ROMERO, 1994).
Na eleição presidencial de maio de 1989, o candidato da UCR, Eduardo Angeloz, foi
derrotado pelo peronista Carlos Saúl Menem, um político então conhecido por já ter sido
governador de La Rioja e preso pelos militares. Com o aguçamento da crise inflacionária,
Alfonsín passou o poder a Carlos Menem dois meses após a eleição, isto é, cinco meses antes
do previsto.
É controverso na literatura política da Argentina o quanto surpreendeu a presidência de
Carlos Menem, a partir de então:
Menen demonstrou uma capacidade notável de reunir em torno de si todos os
segmentos do peronismo, desde líderes sindicais (...) até ex-militantes da
extrema direita ou extrema esquerda da década de 1970, juntamente com todos
os tipos de caudilhos ou líderes locais (...) Em suma, ninguém sabia
exatamente o que o candidato peronista faria se ganhasse, mas estava claro
que ele seria pragmático e não se prenderia a compromissos programáticos.
(ROMERO, 1994, p. 399, tradução nossa).
Naquele mesmo ano, no Brasil, ocorreu a primeira eleição presidencial democrática
desde 1960, numa disputa acirrada entre dois projetos distintos, cristalizados no segundo turno
do pleito, entre Lula da Silva e Fernando Collor de Melo. Um projeto de esquerda que aglutinou,
na ocasião da eleição, o novo sindicalismo e suas novas centrais, os movimentos rurais, o
trabalhismo, o comunismo, o socialismo e a social-democracia, de um lado, contra o
coronelismo, o rentismo e a velha direita oligárquica, de outro (SECCO, 2011). Ou seja, o que
se definia no Brasil com uma disputa implacável, na qual direita e esquerda ficavam em lados
opostos, na Argentina já se dava início a um programa ofensivo de direita no seio de um partido
historicamente de esquerda.
Em verdade, na Argentina, iniciou-se a implantação do neoliberalismo, com um
atrelamento da economia e da política aos EUA. Menem conseguiu desbaratar a inflação e
ancorar cambialmente o peso ao dólar, que passaram a ter de chofre a mesma cotação. Abriu a
economia para a importação e garantiu os pagamentos cada vez mais crescentes do serviço da
dívida externa. Foi o governante sul-americano que mais se apegou ao chamado Consenso de
Washington, normatizando um processo robusto de privatizações e recuo da presença do Estado
nos serviços e subsídios voltados para o grosso da população. O ministro das Relações